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quarta-feira, 23 de maio de 2007

Cultura

Uma breve história do cinema norueguês

A história do cinema norueguês é o registo, através de uma sucessão de eras culturais distintas, de gerações de realizadores, actores e dos que trabalham nos bastidores a cultivar a sua arte. As condições de trabalho sofreram grandes modificações, como sugere uma longa lista de realizadores conhecidos por realizarem um único filme. O apoio financeiro tem sido imprevisível, contudo houve períodos de excelência artística e de forte liderança pessoal. A Noruega sente orgulho na sua herança cinematográfica, que de muitas formas reflecte o desenvolvimento da sociedade norueguesa.

Em comparação com a Suécia e a Dinamarca, que tiveram êxitos anteriores na produção de filmes em grande escala para audiências internacionais, a Noruega chegou tarde ao mundo do cinema. Pouco se sabe sobre o primeiro filme produzido na Noruega. O filme propriamente dito perdeu-se e o material com ele relacionado que ainda resta é ambíguo. Produzido por Hugo Hermansen, em 1906 ou 1908, tinha o título Fiskerlivets farer (Os Perigos da Vida de um Pescador) ou Et drama paa havet (Um Drama no Mar). O esforço seguinte não surgiu antes de 1911, quando Halfdan Nobel Roede produziu Fattigdommens forbandelse (A Maldição da Pobreza), considerado por muitos especialistas como sendo o primeiro filme norueguês. As obras de Roede eram inspiradas pelos melodramas eróticos dinamarqueses da altura, não tendo qualquer relação com a sociedade norueguesa. Apenas em 1920 os noruegueses começam a desfrutar de uma produção contínua de filmes produzidos com carácter profissional. As características da filmografia norueguesa também se alteraram nesse ano, e Fante-Anne (A Cigana Anne), de Rasmus Breistein, deu início ao que é agora conhecido como inovação nacional. Enquanto que a maioria das obras anteriores tinha como cenário o anonimato da grande cidade, os realizadores começaram a concentrar-se na natureza norueguesa e nas alegrias da vida rústica ao ar livre. Os anos trinta podem ser adequadamente denominados a Idade de Ouro do cinema norueguês. O primeiro «sonoro» foi Den store barnedåpen (O Grande Baptismo, 1931), de Tancred Ibsen, neto dos gigantes literários noruegueses Henrik Ibsen e Bjørnstjerne Bjørnson. Os anos antes da guerra foram anos de crescimento e popularidade elevada para a indústria cinematográfica, à medida que os realizadores adaptavam obras literárias famosas ao ecrã e lhes davam vida através da utilização de actores de teatro profissionais.

Durante a ocupação nazi da Noruega na II Guerra Mundial, a produção cinematográfica, bem como a programação de cinema, estiveram sujeitas à censura alemã. No entanto, os públicos acorriam aos cinemas para desfrutar de qualquer entretenimento nórdico que passasse a censura. Paradoxalmente, foi durante este período que foi criada uma direcção-geral do cinema nacional, dando à Noruega as suas primeiras políticas cinematográficas de âmbito nacional. O realizador veterano Leif Sinding foi o administrador da direcção-geral. No fim da guerra, a direcção-geral tinha acumulado um fundo de mais de 10 milhões de coroas norueguesas (cerca de 1,28 milhões de euros).

O período do pós-guerra foi um momento decisivo natural para o cinema norueguês, tendo surgido uma nova geração de realizadores. Edith Carlmar, a primeira realizadora norueguesa, fez dez filmes entre 1949 e 1959. As suas obras aclamadas pela crítica conduziam frequentemente ao debate público e detinham um invulgar poder de atracção do público às bilheteiras. Hoje elas são consideradas clássicos. No último filme de Carlmar, Ung flukt (A Rapariga Caprichosa, 1959), ela lançou Liv Ullmann no que seria o seu primeiro papel de protagonista. Hoje em dia, Ullmann é a actriz e realizadora mais conhecida da Noruega. Troløs (Sem Fé), que Ullmann realizou em 2000, foi nomeado para a Palma de Ouro do Festival de Cinema de Cannes nesse ano. Arne Skouen, que realizou o seu primeiro filme no mesmo ano que Carlmar, tem já 17 filmes no seu currículo. Alguns dos maiores triunfos do cinema norueguês são de sua autoria, como Ni liv (Nove Vidas), de 1957, que foi inclusivamente nomeado para um Óscar. Muitos críticos consideram-no a melhor produção norueguesa de todos os tempos. Os filmes de Skouen continuam a ser procurados em festivais de cinema e outros eventos cinematográficos em todo o mundo. Pelo menos dois outros nomes do período do pós-guerra se salientam. Em 1948, o fabricante de mobiliário Ivo Caprino começou a experimentar com filme e marionetas na sua sala-de-estar. Depressa se tornou o rei norueguês no campo do cinema de animação. O sistema sem igual de Caprino para produção de filmes, com a utilização de marionetas, trouxe-lhe aclamação internacional, não tendo o êxito de bilheteira do seu Flåklypa Grand Prix (Pinchcliffe Grand Prix, 1975) ainda sido ultrapassado. Representante de um género totalmente diferente é Thor Heyerdahl. Kon Tiki, que ele filmou durante a sua expedição de jangada, em 1947, pelo Pacífico, recebeu o Óscar para melhor documentário em 1952, e continua a ser o único filme norueguês a ter obtido um Óscar. Os documentários atraíam muito público nos anos que se seguiram ao final da guerra, particularmente se o assunto envolvesse material relacionado com a guerra ou expedições de exploração. Os anos cinquenta representaram o auge da produção e visionamento de documentários na Noruega. Nos anos sessenta, porém, a televisão começou a substituir o documentário, transformando-se no principal meio de comunicação dos acontecimentos da actualidade e de difusão de programas sobre a natureza. Mais recentemente, os documentários noruegueses regressaram em força. Heftig og begeistret (Fixe & Louco), de Knut Erik Jensen, datado de 2001, e Alt om min far (Tudo Sobre o Meu Pai), de Even Benestad, datado de 2002, receberam ambos vários prémios internacionais.

Outra nova leva de jovens realizadores surgiu nos anos sessenta, influenciada por correntes modernistas na Europa continental. A versão norueguesa da Nouvelle Vague francesa incluiu Jakten (Os Caçadores, 1959), de Erik Løchen, e Liv (Vida, 1967) e Exit (Saída, 1970), ambos de Pål Løkkeberg. Contudo, os cinemas noruegueses estavam dependentes das comédias norueguesas e de grandes sucessos internacionais para conseguirem preencher os seus lugares. Em termos gerais, as famílias tendiam a preferir a televisão. Então veio a explosão jovem e activista dos anos setenta que fomentou o período realista e social mais rebelde do cinema norueguês. Pretendia-se que o cinema fosse político e não artístico, como comprovado por títulos como Streik! (Greve!, 1974), de Oddvar Bull Tuhus, e Det tause flertall (A Maioria Silenciosa, 1977), de Wam e Vennerød, bem como vários documentários progressistas. As mulheres realizadoras saltaram da cozinha para dramatizar temas feministas. Também produziram duros relatos da infância e da adolescência que atraíam públicos adultos (ver As crianças e o cinema). Uma realizadora inesquecível é Anja Breien. A sua trilogia Hustru III (Esposas III), de 1975, 1985 e 1996, constituiu um enorme sucesso, sendo uma crónica das vidas de três mulheres ao longo de três décadas.

No início dos anos oitenta, o cinema norueguês entrou em declínio, e o público, cansado de realismo social cinzento, perguntou a si próprio de quem seria a culpa. Então, com algum êxito, os realizadores viraram-se para os Estados Unidos como fonte de inspiração para conseguirem contar histórias mais entusiasmantes. Orions Belte (O Cinto de Orion, 1985), de Ola Solum, e Veiviseren (O Pioneiro, 1987), de Nils Gaup, tiveram grande número de público e deixaram a sua marca a nível internacional. Em 1988, Veiviseren recebeu uma nomeação para os Óscares na categoria de melhor filme estrangeiro. O restante dos anos oitenta e o início da década de noventa representam um ponto alto para os frequentadores dos cinemas noruegueses com filmes como En håndfull tid (Uma Mão Cheia de Tempo, 1989), de Martin Asphaug, Landstrykere (Vagabundos, 1989), de Ola Solum, Høyere enn himmelen (Para Além do Céu, 1993), de Berit Nesheim, Stella Polaris (Estrela Polar, 1993), de Knut Erik Jensen, Telegrafisten (O Telegrafista, 1993), de Erik Gustavson, Drømspel (Jogo de Sonhos, 1994), de Unni Straume, Over stork og stein (Doido Varrido, 1994), de Eva Isaksen, Ti kniver i hjertet (Juro Pela Minha Vida, 1994), de Marius Holst, e Ovos (1995), de Bent Hamer. Uma nova mudança de gerações estava a caminho.

O realizador Hans Petter Moland escreveu um novo capítulo na história do cinema norueguês com o lançamento, em 1996, do seu Kjærlighetens kjøtere (Zero Kelvin) em Nova Iorque. Em Fevereiro de 1997, Søndagsengler (O Outro Lado do Domingo, 1996), de Berit Nesheim, foi nomeado para o Óscar de melhor filme estrangeiro. Budbringeren (Correio Desinteressante, 1997), realizado por Pål Sletaune, teve a sua estreia durante a Semana da Crítica no Festival de Cinema de Cannes, acabando por obter o prémio principal naquela secção. O filme foi exibido em todo o mundo e ganhou vários outros prémios. Insomnia (Insónia), de Erik Skjoldbjærg, participou na mesma secção no Festival de e chamou a atenção internacional nesse mesmo ano. Em 2001, Elling, de Peter Næss, foi nomeado para o Óscar na conhecida categoria de melhor filme estrangeiro. E Harald Zwart (Uma Noite com McCool, 2001; O Agente Cody Banks, 2003) provou que ser norueguês não constitui nenhuma barreira para ser bem sucedido em Hollywood. Mais recentemente, Skjoldbjærg, Moland, Næss e Hamer fizeram filmes nos E.U.A., conferindo uma posição firme à Noruega no mapa internacional de cinema com filmes como Prozac Nation (2001), Beautiful Country (2004), Mozart and the Whale (2004) e Factotum (2005).
As curtas-metragens norueguesas competem com êxito em festivais por todo o mundo. Durante a Semana da Crítica em Cannes, em 2003, a curta-metragem que ganhou foi O Amor é a Lei de Eivind Tolås. No mesmo festival, na secção da Quinzena dos Realizadores, Bent Hamer apresentou o filme Salmer fra kjøkkenet (Histórias da Cozinha, 2003), que lhe proporcionou vasta aclamação, ganhando o prémio para a distribuição europeia e dando início a um interesse de vendas global.

Foi lançada nos últimos anos uma grande quantidade de impressionantes documentários noruegueses, incluindo os bem-sucedidos Heftig og begeistret (Fixe& Louco) em 2001, Alt om min far (Tudo Sobre o Meu Pai) em 2002, Ungdommens råskap (Quebra de Concentração em Alunos do Liceu na Noruega) em 2004 e Alt for Norge (Um Guia Através de 100 Anos de História da Noruega) em 2005.

O ano de 2003 assistiu ao lançamento de uma grande quantidade de filmes noruegueses, mais que no ano anterior, e essa tendência de sucesso continua. Os números relativos ao público dos filmes nacionais são elevados e o cinema norueguês tem sido aclamado a nível internacional. Estes factos devem-se em muito à reestruturação dos esquemas de incentive e à criação do Fundo Norueguês do Cinema em 2001. Também 2006 parece estar a ser um ano promissor para a indústria cinematográfica norueguesa. Uma onda nova de realizadores e de actores de talento está já a caminho de causar impacto.

Foto do dia

Å, Lofoten

terça-feira, 22 de maio de 2007

Cultura

A história do bacalhau

Originário das águas frias e límpidas dos mares que circulam o Pólo Norte, o bacalhau é um alimento milenar: registros mostram a existência de fábricas para seu processamento na Islândia e na Noruega desde o século IX.

O mercador holandês Yapes Ypess foi o primeiro a fundar uma indústria de transformação na Noruega, por isso, é considerado o pai da comercialização do peixe industrializado. A partir de então, a demanda pelo peixe passou a crescer na Europa, América e África, o que proporcionou o aumento do número de barcos pesqueiros e de pequenas e médias indústrias pela costa norueguesa, transformando a Noruega no principal pólo mundial de pesca e exportação do bacalhau.

Secar ao ar livre
Mas os grandes pioneiros no consumo do bacalhau são os Vikings que, ao descobrirem o peixe, passaram a secá-lo ao ar livre (na época o sal não existia) até endurecer – perdendo cerca da quinta parte de seu peso – para poder consumi-lo aos pedaços em suas longas viagens marítimas.
Antes da industrialização do bacalhau, os bascos – cujo território atualmente está espalhado em províncias da Espanha e da França – já comercializavam o bacalhau. Como já conheciam o sal, eles começaram a salgar o pescado para aumentar sua durabilidade. O bacalhau passou a ser comercializado curado e salgado por volta do ano 1000. Os bascos expandiram o mercado do bacalhau, tornando-o um negócio internacional porque o sal não deixava que o peixe estragasse com facilidade. Quanto mais durável o produto, mais fácil era sua comercialização. Como a geladeira só foi inventada no século XX, os alimentos que estragavam rapidamente tinham comércio limitado.

Alimento durável e "frio"
Então, já na idade medieval, o bacalhau ganhou o título de alimento durável e com sabor mais agradável que o dos outros pescados salgados. Para a população pobre que raramente podia comprar peixe fresco, o bacalhau era um prato "cheio" porque era barato e tinha alto valor nutritivo.
A soberania da Igreja Católica foi outro facilitador para seu comércio: o catolicismo impunha dias de jejum – que compreendiam as sextas-feiras, os quarenta dias da quaresma e muitos outros dias do calendário cristão – nos quais se proibia a ingestão de comidas "quentes" como as carnes; somente as comidas "frias", como os peixes, eram permitidas. Assim, a carne passou a ser proibida em quase metade dos dias do ano, e os dias de jejum acabaram se tornando dias de bacalhau salgado.

Desde 1843O
hábito brasileiro de saborear bacalhau é herança da colonização portuguesa, que começou a se disseminar a partir do descobrimento do Brasil. Mas somente com a chegada da corte portuguesa e dos comerciantes lusos no país, no início do século XIX, que o consumo do pescado foi impulsionado e difundido entre a população.
No mesmo período, o Brasil estreita os laços comerciais com a Noruega e começa a importar o Bacalhau: a primeira exportação oficial do produto aconteceu em 1843. Hoje cerca de 95 porcento do bacalhau consumido no Brasil tem sua origem na Noruega.

Enraizou à culinária do país
Caracterizado inicialmente como um alimento barato, sempre presente nas mesas das camadas populares, o bacalhau virou artigo elitizado depois da Segunda Guerra Mundial. Como havia escassez de alimentos em toda a Europa, o preço do pescado subiu e seu consumo ficou restrito: passou a ser consumido apenas nas principais festas cristãs.
Com o passar dos anos, o peixe se enraizou à culinária do país e conquistou definitivamente o paladar dos brasileiros, estimulando chefs e apreciadores a prepararem receitas criativas e saborosas. Tanto que se tornou tradição comer bacalhau em épocas festivas e de confraternização como Semana Santa e Natal
Iguarias com o nobre pescado estão sempre presentes nos bons restaurantes e nos cadernos de receitas das donas-de-casa brasileiras. Graças a sua versatilidade, o peixe pode ser preparado de diversas formas e se adapta a uma infinidade de receitas. O bolinho de bacalhau, por exemplo, é preparado de forma muito peculiar no Brasil e se tornou uma preferência nacional.

Foto do dia

Aker Brygge, Oslo

segunda-feira, 21 de maio de 2007

Foto do dia

Trondheim